sexta-feira, agosto 31, 2007

pensando com os ventos do entardecer


Debaixo deste carvalho passo muito do meu tempo de leituras.
Na rede, esticada entre árvores, protegidas por "lâminas” de pneu, para as cordas as não ferirem. Por razão da orientação solar é debaixo desta que minha cabeça fica pois dá uma sombra excelente.
Muitas vezes esqueço-me do livro e fico a olhá-la
e ao céu, que avisto entre folhas.

E foi num desses espaços de sonhar ou me perder (para melhor me encontrar), de olhos abertos que lembrei a ave que um dia se aninhou em minha mão.

Como pude olvidar coisa tão incomum e significativa?
Só encontrei uma explicação plausível: demasiado centrado em mim e nas exigências do trabalho.
Como se o trabalho e eu, fôssemos uma e a mesma coisa.

E deste pensamento um outro, inquietante se colou a mim e me tem atormentado porque lhe não encontro a resposta. E a resposta, neste caso, é só uma!
Só uma É a resposta certa.

Será que da mesma forma que esqueci a pequena ave que em sobressalto se aninhou em minhas mãos, como no ninho, sua morada, alimento e protecção, fazendo-me sentir parte integrante da vida e da criação, numa harmonia que lhe transmitiu que de mim nada tinha a recear, será, pergunto-o a mim mesmo e espero encontrar A resposta, que da mesma forma em que o auto-centramento me fez esquecer aquele momento de magia descurei a atenção e o carinho para com a M.M. e ela, sempre tão generosa o recobriu para que disso me não desse conta e continuasse minha caminhada em direcção a objectivos profissionais, reconhecimento, promoções, mais responsabilidades – consequentemente distanciamento do real, vejo-o agora?

Não são remorsos o que sinto caso tal tenha acontecido pois sei que ambos éramos, fomos, felizes.
Interrogo-me sim, qual a percentagem ou se quiserem a “taxa de esforço” de cada um de nós no percurso conjunto, para não voltar a cometer erros semelhantes e em todos os momentos e ocasiões saber dizer: basta!
Pela vida em si, pelos que amo e também por mim.
Não sou um “trabalhador”, não sou um “activo”…estas categorias são falsas.

Sou um ser humano e se o trabalho, com determinadas características, se tornou a pedra de toque, a mola da economia e nos convenceram e nos convencemos de que isso era tudo e fundamental, confundindo o eu que trabalha com a personna, há que reverter este processo e depressa.

Antes que a humanidade se perca em meandros que nada terão de humano.

O que acabei de escrever não é descoberta recente.
É consciência sempre presente.
Mas a questão está exactamente no “sempre”(?)

Quantas vezes, no esforço para corresponder às expectativas (como se as minhas de exigência e rigor perfeccionista não fossem por si suficientes), para fazer bem, não terei esquecido este “sempre”?

A pressão social é muito forte sobre o indivíduo e nós boiamos nela desde o nascimento, como num caldo. Fazemos parte dela.
Diluímo-nos como o sal ou o açúcar na água. Passamos a ser também pressão.

E é a isto que devemos obstar. Não perder a identidade, não deixar que se dilua quando a julgamos cada vez mais forte, mas nada mais é do que uma ilusão criada pela aceitação e reforço social em que nos tornamos mais e mais homogéneos, uniformes.

Informes.
Fato, camisa, gravata, pasta, portáteis (telefone e computador) agendas cheias, almoços e jantares de trabalho, para não falar dos “brunchs”!

Digamos que estou numa licença sabática. Um destes dias voltarei à denominada “vida activa” – como se a que aqui levo, a tratar da casa, de mim, dos meus companheiros de quatro patas, fosse inactividade, nulidade, coisa nenhuma.

O meu cão (Batalha) pastor Serra da Estrela, dá-me um toque com a pata exigindo atenção.
Olho-o.
Fita-me atento com aqueles enormes e lúcidos olhos que me intrigam e dá um latido que só posso definir como muito assertivo, quase conclusivo de algo e cala-se inclinando ligeiramente a cabeça como que a confirmar se entendi.

Um destes dias talvez lhe responda.
Não hoje.
Não, ainda hoje!
(flores do meu "jardim")

terça-feira, agosto 28, 2007

Por ora, quedo-me neste meu novo lar

E ao escrever o que supostamente é o título deste post dei conta do absurdo, pois o meu lar é o mundo todo, todo-o-mundo e o cosmos sem fim.
Mas aqui e agora, neste momento, ao dizer: “lar”, falo desta casa que habito, do espaço envolvente, jardim-quintal, tudo misturado como convém, pois assim é a natureza, não uma coisa super-ordenada, onde plantei – desenvasando – as plantas favoritas da Maria Manuel e vou acrescentando plantas rasteiras e arbustos autóctones que sempre trago de minhas caminhadas.
O espaço ainda é amplo, assim o quis, não gosto de limites, não tem muros nem delimitações.
Para além da casa de origem mandei construir, e colaborei na construção, um anexo que se pode considerar uma casa para hóspedes, família e outros.

Estou agora a estudar com camponeses da zona – esta é uma das maravilhas – encontrarmo-nos por aí, eles trabalhando, eu deambulando, e ficarmos à conversa como velhos conhecidos e amigos – estou pois a estudar com a ajuda deles, quais as árvores de fruto que melhor se adequarão quer ao clima quer ao tipo de solo, para no Outono as plantar.
Como a água me não falta irei aprender com eles a cultivar alimentos; batatas, legumes vários e farei uma pequena horta.
(a flor do hipoericão do Gerês - essa tenho aqui, é linda, não é?)

(e estes frutinhos deliciosos, conhecem?
Medronhos. Não tenho mas já combinei com um dos meus novos
amigos e vamos transplantar na época certa.
Hummm! Que delícia)


E peguei nos livros da M.M e comecei a ler.
Ela sempre foi muito dada àquilo que costumamos designar por esoterismo – creio que o adequado será falar no plural dadas as várias correntes, ainda que afinal o fio condutor e o término sejam os mesmos.


Tenho muito para ler e agora, aqui, sinto que entendo o que leio.
Quase como se os livros e este espaço me esperassem.
Creio que me desintoxiquei e a alma está mais aberta.
Assim como a mente.
Até comecei a fazer Yoga seguindo, com muito cuidado, um desses livros.

sábado, agosto 25, 2007

caminheiro no mundo

Andei por fora uns dias.
Mochila às costas com tudo o que achei fundamental e, surpreso, descubro como afinal tão pouco nos é necessário.
Caminheiro como nos idos da juventude.
Desta vez nem tenda levei.
Um bom saco cama, daqueles k nos cobrem e nos fazem parecer crisálida em casulo, foi mais do que suficiente.

À noite, a minha distracção a prazer era o de ficar a olhar a abóbada celeste, pontilhada de miríades de estrelas e outros mundos.

Reaprendo a perdida ligação ao mundo real e vivo.
Sinto-o crescer em mim, ou seja a RE-ligar-me a ele e dá-me paz.

(fotos daqui, Ecotura)

As que tirei não ficaram bem....

segunda-feira, agosto 20, 2007

Voltou

O silêncio voltou.
Nos últimos oito dias tive a presença/companhia de meus dois filhos e filha, seus cônjuges e filhos, meus netos.
No total onze pessoas. Onze seres maravilhosos que amo.

Receava este reencontro.
Receava muito, mas nunca o disse.
Nem alimentei muito tal pensamento em mim, apesar de, volta e meia, ele se colar, como carraça. Principalmente – não deixei que de mim se alimentasse.

Foi a primeira reunião de família depois da morte de Maria Manuel.

Temia o sobressalto, a dor a abrir-se de novo em chaga intensa pelas lembranças partilhadas, mas, principalmente pelo tanto dela que há nos filhos.
Semelhanças físicas e não só.
O jeito de se moverem, de olhar, pequenos tiques tão dela e que os filhos, os três, perpetuam, de uma forma ou outra.
A forma de fazerem determinada tarefa…
Estando distraído as imagens sobrepõem-se, a dela e a de um dos filhos ou da filha.
A cor e forma dos olhos…os três têm (como se costuma dizer) os olhos da mãe.
Forma, cor e um cintilar profundo entre o riso e a ironia que nos lembra que a vida não é para ser excessivamente levada a sério.

Mas não. Foi um tempo de riqueza e partilha em que a dor não reinou.
Creio que todos, sem excepção sentimos o seu perfume, o seu toque suave. Uns disseram-no, outros, mais senhores do seu papel de cientistas, “não embarcaram (palavras deles) nessas partidas que a memória nos prega…”

Foi um tempo de serenidade e alegria.
Nenhuma dor nos ensombrou.
A presença, memória, lembrança, sempre presente mas com alegria por uma dádiva que foi para todos o havermos tido aquela fantástica mulher em nossas vidas.
E por isso estou grato.
Hoje à noite já dormirão em suas casa. Dois casais no Canadá e um nos E.U.
Foram descansados porque viram e sentiram como estou bem.

Eu saí reforçado e mais feliz.

Entretanto se me permitem sugiro a leitura do seguinte livro: Bom Trabalho, de Ken Blanchard, Editora Pergaminho.

Comprei-o quando fui comprar umas lembranças para a família.
Aprendi muito com ele e sei que continuarei a aprender com este pequeno livro de 119 pgs.
Boa semana

quarta-feira, agosto 15, 2007

Hoje, 15 de Agosto de 2007-08-15


passa o feriado designado de Nossa Senhora da Ascensão.

É bom lembrarmos que passa uma festividade pagã, ligada à terra e aos seus produtos – colheitas – que a igreja católica recobriu com o vasto manto com que cobre a Virgem.

O excesso de zelo da igreja católica em retirar do calendário tudo o que fugisse aos seus parâmetros e em que sentisse um ligeiro perfume pagão, fez com que se perdessem velhos e bons costumes, como este, de gratidão por tudo o que a terra dá.

Afinal agradecermos o que a terra nos dá, não é mostrar gratidão a Deus?
E não é Deus um só e a UNIDADE?
Não é a terra e tudo o que dela nasce e a ela retorna, obra sua?

O nome do mês - Agosto, deriva do nome do imperador Augustus, que assim nomeou este mês por ser considerado tão importante e nele congregarem, os homens, a gratidão aos frutos da terra que lhe permitem existir, alimentar-se e viver.

Ao recobrir estas festividades a igreja afastou o homem da natureza, sendo que para mim a única Igreja/espaço é o mundo. As serranias, os rios, as florestas, os bosques, os prados, as searas, todas as culturas que dela brotam por labor humanos e fecundidade do planeta vivo.

Este recobrir outras festividades de forma redutora nada mais representa do que a lógica de poder, sendo que a lógica de poder tem a ver com o poder terreno.
Que posso dizer à igreja católica senão inquirir-lhe qual é, afinal, a sua área?

A espiritual ou a terrena e material?

segunda-feira, agosto 13, 2007

Lembrando Miguel Torga no centenário do seu nascimento



De tantos belos e grandiosos poemas escolho este.

De alma de menino.
***
Sei um ninho.
**
E o ninho tem um ovo.
E o ovo, redondinho,
Tem lá dentro um passarinho
Novo.
Mas escusam de me atentar:
Nem o tiro, nem o ensino.
Quero ser um bom menino
E guardar
Este segredo comigo.
E ter depois um amigo
Que faça o pino
A voar...

quarta-feira, agosto 08, 2007

uma experiência que agora vivo dia-a-dia



Apesar da Primavera que tão diferente foi, apesar do Verão-Outonal-Invernoso, tenho andado por fora.
Creio que não tarda poderei dizer que conheço o Gerês melhor do que a palma da minha mão.

Tenho-o palmilhado dia após dia. Semanas houve em que nem voltei a casa.
Saía já apetrechado para ficar fora uns dias e assim fiz. Embrenhei-me neste mundo de beleza e magia. Deixei-me contaminar por ele.
Deixei o seu silêncio encher-me e esvaziar-me, então, depois encontrei mais paz em mim do que me lembro de alguma vez ter sentido.

Agora, sempre que penso na minha querida Maria Manuel, não sinto dor.
Sinto-a tão presente em tudo o que está vivo e vibra, mesmo no que os meus limitados olhos e restantes sentidos humanos não conseguem ver ou apreender, muito menos compreender.

Há quem vá para um retiro, para Kathmandu…
Sei lá, para lugares distantes.
Para quê? Basta que nos deixemos ir, envolver pela força da natureza, ligarmo-nos a ela de novo, desprendendo-nos das coisas com que enchemos o nosso dia-a-dia nas cidades actuais e com que atafulhamos as casas, as almas….
Desprendermo-nos das coisas e de nós mesmos, do nosso ego tão competitivo na sociedade que construímos e que é uma sociedade doente e que nos provoca doenças.

Não vale a pena ir para lugar algum.
Nem perto nem longe porque qualquer “viagem” que valha mesmo a pena, que nos faça entrever o real que ocultamos com camadas e camadas de véus de medos, de rejeições…, é uma viagem interior.
Tão simples quanto isto.
Claro que o estarmos num local onde a natureza ainda vive, onde podemos sentir fluir a energia vital que liga os vários planos, e deixarmos, de coração aberto, que entre em nós, nos habite, facilita a viagem e, mais do que isso, a tomada de uma nova consciência que poderá vir a ser vital para a sobrevivência da humanidade.

Hoje já não lembro Maria Manuel com dor, mas com gratidão e alegria por tudo o que juntos vivemos e partilhámos e nunca mais voltei a sentir no peito a dor da sua ausência.
Nem sei mais o que se designa por solidão apesar de passar semanas sem ver ou sequer falar com outro ser humano.

Gostaria de vos saber explicar mas não sei. Podem pensar que o estar isolado me enlouqueceu ou que deliro.
Eu sei que não e o que possam pensar não me afecta.
Por outro lado afecta-me o não saber transmitir-vos a minha experiência, pois sei o que ela fez por mim, como sou um ser humano em aprendizagem.
Tranquilo agora, sem receios nem dores, capaz de olhar o mundo e a vida de uma forma que nunca pensara possível apesar de ter uma vaga memória de algo semelhante quando criança, mas sei que as crianças de hoje, com os perigos que espreitam por todo o lado estão tão confinadas a espaços fechados e sempre sob vigilância de adultos que lhes não permite este tipo de interacção.

Quase não têm contacto com a natureza, em si e, quando a têm é no âmbito de tutela de adultos e actividades organizadas.
O espaço para a descoberta e a imaginação, não orientada, está prejudicado.

Não critico os pais. Protegem os filhos de uma sociedade doente, Estão certos. Temos é que entender isto e lutar para reconstruir um outro ser humano, capaz de criar uma sociedade à sua medida.
Humana como parte do todo planetário e cósmico.

P.S - sabia que há muito aqui não vinha, mas só agoa tive a visão temporal do afastamento.
Aos que por aqui passaram entretanto, as minhas desculpas.